Essas continuam sendo as duas prioridades do governo Bolsonaro, não obstante o aumento de infectados e de mortos pela pandemia da Covid-19.
Por Alfredo J. Gonçalves
Essas continuam sendo as duas prioridades do governo Bolsonaro, não obstante o aumento de infectados e de mortos pela pandemia Covid-19. Para isso o capitão conta, de um lado, com sua infantaria ligeira, constituída pelas redes sociais da Internet e pelo grupo dos 300, este último até há pouco acampado na praça dos três poderes e fortalecido pelos encontros diários com o comandante em chefe. De outro lado, conta igualmente com uma artilharia pesada, formada pelo clã familiar, pelo gabinete do ódio e pelos ministérios da ala ideológica. Reforçada, ademais, pelos militares mais afinados com um tipo de pensamento conservador e retrógrado ou com um nefasto saudosismo herdado dos tempos “áureos” da ditadura. O caráter ativo e belicoso desse exército permanentemente mobilizado não poupa munição quando se trata de fritar, destruir ou eliminar os que se recusam a participar da mesma guerra.
Desfraldando tais bandeiras prioritárias, infantaria e artilharia mantêm um bombardeio nutrido e sem tréguas, sobre os demais poderes, instituições, organismos e instrumentos próprios de uma democracia real e sobre qualquer opinião adversa ou postura crítica, bem como sobre a ONU e a OMS - Organização Mundial da Saúde. Os opositores que pensam de forma diferente se tornam “inimigos”, e estes devem ser abatidos. Daí o fogo cerrado contra os meios de comunicação social e seus respectivos jornalistas e repórteres, contra a academia e suas respectivas pesquisas científicas, contra a cultura e a arte e suas respectivas formas de expressão. Quem ousar pensar, e sobretudo quem ousa pensar diversamente, torna-se alvo imediato dessa “bancada da bala”, a qual, paradoxalmente, por vezes se confunde com a “bancada da Bíblia”.
Ataques
Nesse cenário tenso e conflituoso, não surpreende os ataques frequentes à mídia, ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal, neste último caso até com rojões – numa espécie de figuração dos canhões no campo de batalha. A atmosfera agressiva, de resto, envolveu todo o processo da campanha eleitoral, estendendo-se posteriormente para o exercício do governo. Em outras palavras, é preciso manter os “soldados” em forma no decorrer de todo mandato, em vista do próximo enfrentamento, em 2022. Porém, e de maneira mais urgente ainda, é preciso blindar os membros do clã, bem como os amigos fiéis e partidários, contra a avalanche de pedidos de impeachment, de inquéritos e de investigações que correm no Ministério Público, nas instâncias do Poder Judiciário e na Polícia Federal.
Um revés imprevisto, contudo, caiu como um raio sobre a estratégia agressiva adotada. A prisão de Fabrício Queiroz, escondido na casa do advogado dos Bolsonaro, rasgou de cima abaixo o tênue véu do discurso moralista e de anticorrupção. Como nos lembra a fábula, “o rei está nu”! O semblante, os gestos e o comportamento do capitão sofreram uma mudança de 360 graus. Nos últimos dias, o silêncio eloquente tomou o lugar do palavreado fácil, arrogante e ofensivo. O exército deixou as trincheiras do front e recuou para a defensiva. Não são muitos os cidadãos brasileiros dispostos a acreditar que o presidente nada tenha a ver com a presença de Queiroz na casa de Frederick Wessef, em Atibaia.
Enquanto isso, os números referentes à pandemia sobem de forma vertiginosa. O Brasil já conta com mais de 1,3 milhão de pessoas atingidas pelo Coronavírus, ao mesmo tempo que as mortes ultrapassaram a cifra de 57 mil. Neste triste ranking, o país ocupa o segundo lugar, atrás apenas dos Estados Unidos, país do qual, aliás, tem copiado não poucos exemplos. Preocupante é saber que por trás de cada número e de cada cifra, oculta-se um nome, um rosto, uma pessoa, uma história construída de sonhos e esperanças, mas ceifada precocemente. E mais perturbador é ter consciência de que cada pessoa que partiu representa uma família enlutada, em geral sem o conforto de uma despedida respeitosa. E nessa tragédia sem igual, o silêncio e a indiferença do presidente retroagem ao início mesmo da pandemia, batizada por ele de “gripezinha”. Poucas ou nenhuma palavra de condolências, de aproximação e de solidariedade. E daí? Lamento!