Com o Ano da Misericórdia temos uma oportunidade para, nos braços de um Deus que é Amor, abrir caminhos de diálogo, compreensão, perdão, reconciliação e paz, afirma teólogo.
Por Jaime C. Patias
“Jesus Cristo, com sua Páscoa, nos alcançou a reconciliação, mas ao longo da história nós deve atualizar esta graça. Todos nós precisamos nos libertar do peso das ofensas e, assim, sermos semeadores de paz, bondade e esperança em meio a tantos desencontros e egoísmo”. Esta foi a tônica da conferência proferida pelo padre carmelita, Eugene P. Sainz de Baranda, nesta quarta-feira, 30, no 1º Simpósio Internacional de Missiologia que acontece em Porto Rico.
O evento reúne em Aibonito, a 40 quilômetros da capital San Juan, cerca de 100 representantes das Pontifícias Obras Missionárias (POM), organismos e conferências episcopais de 21 países do Continente americano.
Ao refletir sobre a misericórdia como fonte de reconciliação, padre Baranda lembrou que Deus se manifesta, ao longo da história, como um Deus misericordioso. Isso se evidencia na história do ser humano com seus muitos pecados. “Jesus Cristo, Deus e homem, vem para ser a encarnação da misericórdia de Deus em sua expressão plena”, explicou o teólogo. “Nos caminhos da missão Jesus encontra todo o tipo de miséria humana, doentes, sofredores, famintos, pobres, injustiçados. Em ambos, no Antigo e no Novo Testamento encontramos muitas páginas de reconciliação”.
A partir disso, padre Baranda, que é professor de teologia na Universidade Católica e diretor do Centro de Espiritualidade São João da Cruz em Santa Cruz de La Sierra, Bolívia, apresentou a reconciliação em suas várias dimensões: pessoal, familiar, religiosa, política, social, cultural e ecológica.
Diante da degradação ambiental fruto da agressão violenta do próprio ser humano, padre Baranda falou da necessidade da “reconciliação ecológica”. Segundo ele, o Apóstolo Paulo situou a reconciliação no contexto da criação. “A ecologia éeminentemente unitária, vivida na interdependência e interação entre os organismos vivos em toda a sua complexidade e beleza”. Contudo, “as imagens que o nosso mundo oferece é de estresse, de tensão, injustiça estrutural, de agressão que desencadeia em violência e nos torna defensivos. O conflito é o nosso companheiro de viagem”, destacou.
Ano da Misericórdia
Com o "Ano da Misericórdia" temos uma oportunidade para, nos braços de um Deus que é Amor, abrir caminhos de diálogo, compreensão, reconciliação e paz.
A misericórdia é o sacramento da reconciliação por que é puro perdão. Nesse sentido, o professor destacou que o papa Francisco, na Bula Misericordiae Vultus (O rosto da misericórdia), sobre o Ano da Misericórdia salienta que “a experiência do perdão em nossa cultura está desaparecendo”, e nos adverte que sendo a justiça, “o primeiro passo, necessário e indispensável, a Igreja precisa ir mais longe para alcançar um objetivo maior e mais significativo” (MV 10). O perdão é a nossa parábola diária, viva e eficaz, que "nos permite experimentar na própria carne a grandeza da misericórdia, já que esta é prova de como Deus ama" (MV 17).
Para viver a reconciliação, padre Baranda propôs resgatar a alma samaritana que Deus colocou em cada pessoa. “O Samaritano não somente fez um caminho de aproximação, mas também foi capaz de colocar o homem ferido em seu lugar, fazendo-o centro de seus interesses e preocupações”, afirmou e complementou: “somente a pessoa reconciliada pode reconciliar”.
Sonhos de reconciliação
Por fim, padre Baranda citou algumas parábolas que revelam o sonho de reconciliação, a exemplo do profeta Isaias que profetizou à luz do Príncipe da paz, o Messias: “O lobo viverá com o cordeiro, o leopardo se deitará com o bode, o bezerro, o leão e o novilho gordo pastarão juntos; e uma criança os guiará. A vaca se alimentará com o urso, seus filhotes se deitarão juntos, e o leão comerá palha como o boi. A criancinha brincará perto do esconderijo da cobra, a criança colocará a mão no ninho da víbora". (Is 11 6-8).
Recordou também o sonho de Martin Luther King (28.08.1963): “Eu tenho um sonho que um dia, nas montanhas rubras da Geórgia, os filhos dos descendentes de escravos e os filhos dos descendentes de donos de escravos poderão sentar-se juntos à mesa da fraternidade. (…) Eu tenho um sonho que meus quatro pequenos filhos um dia viverão em uma nação onde não serão julgados pela cor da pele, mas pelo conteúdo do seu caráter. Eu tenho um sonho hoje”.
Trouxe ainda o testemunho contado pelo cardeal Christoph Schoborn, sobre duas mulheres colombianas, Fedra e Maria. Fedra, doente de câncer, antiga guerrilheira das FARC, e Maria, sobrevivente de um ataque terrorista, gravemente queimada. Seu esposo e três filhos morreram em um atentado das FARC. Houve um encontro de misericórdia entre as duas mulheres “Fedra, a ex-guerrilheira doente, se apoia sobre o ombro de Maria, a mártir. Ambas carregam sua cruz e triunfou o amor”.
Em tempos de divisão e ódio, de degradação social e ambiental, a missão deve ter em conta a misericórdia e a reconciliação. “E quando triunfa o amor, nasce a misericórdia, aparece o perdão e floresce até a ‘impossível’ reconciliação”, finalizou padre Baranda.
O Simpósio é uma das etapas na preparação para o 5º Congresso Missionário Americano (CAM 5) a realizar-se no mês de julho de 2018, em Santa Cruz de la Sierra na Bolívia. Um segundo Simpósio semelhante terá lugar em fevereiro de 2016 no Uruguai.