Edson Luiz Sampel *
O papa Francisco, há poucos dias, numa audiência de quarta-feira, manifestou a intenção de baixar uma lei, determinando que os processos judiciais de nulidade de casamento passem a ser gratuitos. A notícia é deveras alvissareira. A distribuição da justiça deveria ser de graça tanto na esfera canônica quanto no âmbito estatal, pois se trata de um direito impostergável da pessoa humana.
A implementação de um eventual decreto pontifício, no entanto, terá de levar em consideração diversas nuanças. Pensemos, particularmente, no Brasil. Os tribunais eclesiásticos praticam valores diferentes. Não há uma tabela fixada pela conferência episcopal (CNBB). Demais, em alguns lugares, as próprias cortes canônicas, além de conceder um pró-labore aos juízes, defensores do vínculo e auditores, concedem-no, também, aos advogados, bem como aos servidores (notários etc.). Em outras regiões, os tribunais não arcam com os honorários advocatícios, cabendo ao demandante (autor do processo) remunerar o causídico.
Num primeiro momento, como medida imediata, talvez se pudesse estudar a possibilidade de minorar as custas judiciais, reduzindo-as pela metade. Contudo, é óbvio que as referidas taxas, vultosas para determinados segmentos sociais (em alguns lugares, 10 salários mínimos), deveriam produzir, em contrapartida, um serviço judiciário de excelência, isto é, de ótimo nível profissional, implicando, destarte, uma análise bastante percuciente, posto que célere, do casamento concreto, pois o matrimônio válido é indissolúvel e há de ser salvaguardado pela autoridade eclesiástica. Sabe-se que o voluntariado não se aplica a algumas realidades. Por este motivo, muitos vigários judicias optam pelo sistema do pró-labore, exigindo, então, dos seus colaboradores uma participação constante e de boa qualidade. De qualquer modo, um eventual corte de 50% nos ganhos dos operadores do direito eclesiástico, a meu ver, não causaria grandes problemas, porquanto a atividade judiciária não deixa de ser exercida no espírito de apostolado (Resumo de Direito Canônico, Edson Luiz Sampel). É claro que seria uma enorme injustiça retirar um centavo que fosse do salário dos empregados dos tribunais, ou seja, dos que labutam nas cortes canônicas com vínculos empregatícios, regulados pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Neste rol encontra-se uma minoria de indivíduos, constituída por recepcionistas, funcionários do cartório, faxineiros etc. e, em alguns tribunais, até um ou dois notários, que não são propriamente agentes de pastoral no sentido estrito, mas empregados com carteira registrada.
Penso que, a médio prazo, um expediente simples importaria numa estrondosa queda de despesas e, conseguintemente, na readequação das custas judiciais. Refiro-me ao "processo eletrônico". Com efeito, além de emular a tendência de racionalização da justiça estatal, as cortes canônicas simplificariam o labor dos juízes, advogados e defensores do vínculo, vez que não seria mais necessário um prédio, onde se guardam os autos de papel e comparecem os operadores do direito. Bastaria, por enquanto, um local simples, talvez uma sala da cúria, para o atendimento do público. Ter-se-ia acesso ao processo por um computador, em qualquer parte do mundo. Existem, decerto, programas de informática bastante eficazes, que preservam o segredo de justiça dos processos de nulidade, franqueando o acesso apenas aos que dispõem de uma senha.
Não tenho dúvidas de que o santo padre, insuflado pelos pleitos expostos na assembleia do sínodo da família, dentro em breve introduzirá novidades relevantes para os processos de nulidade do sacramento do matrimônio, quer barateando as custas judicias, quer extinguindo-as de vez.
* Edson Luiz Sampel é doutor em Direito Canônico pela Pontifícia Universidade Lateranense, de Roma e membro da União dos Juristas Católicos de São Paulo (Ujucasp). É colaborador da revista Missão.
Fonte: www.zenit.org