???Toda a vivência da fé tem uma repercussão política???, afirma Frei Betto

Jaime C. Patias

"O que a fé tem a ver com a política e o que a política tem a ver com a fé?" A questão foi posta pelo teólogo e escritor, Frei Betto, na manhã deste sábado, 16, ao abordar o tema: "Poder na Cultura do Bem Viver", em conferência proferida no 9º Encontro Nacional Fé e Política que acontece na Universidade Católica de Brasília (UCB), campus de Taguatinga Sul (DF).

Frei Betto defende que Jesus morreu como prisioneiro político. "Cristão significa discípulo de Cristo. E como é que Jesus morreu?" Depois perguntou: "como Vladimir Herzog (jornalista) morreu? Ele foi preso, torturado pelos militares do DOI-CODI de São Paulo e foi assassinado. Jesus também foi preso, foi torturado e assassinado por decisão de dois poderes políticos o Sinédrio Judaico e o ocupante romano representado pelo governador Pôncio Pilatos".

Para o teólogo a pergunta deveria ser outra: "por que nossa fé hoje não incomoda a desordem estabelecida?" Em seguida afirmou que, "toda a vivência da fé tem uma repercussão política, ou para sacralizar o que está aí ou para questionar. Não existe uma fé neutra". Com isso, alertou para o uso da fé de forma milagreira, para fugir do enfrentamento dos verdadeiros problemas estruturais do país ou para alimentar fundamentalismos.

Frei Betto foi categórico em afirmar que "todos nós somos discípulos de um prisioneiro político e queremos que nossa fé seja fermento na massa". Para ele, é importante não "partidarizar a fé", nem "confessionalizar a política". Quando se funda um Partido Cristão, já no nome se exclui todos os que não são cristãos. "Qualquer partido que tem adjetivo de religião está errado porque uma das conquista da modernidade é que os partidos e o Estado sejam laicos. O Estado e o partido não devem ter religião, mas respeitar a diversidade do pluralismo religioso". Betto avalia que, no Brasil, "estamos assistindo certos seguimentos religiosos a começarem a chocar o ovo da serpente, expressão que vem do nazismo dos anos 30 (do século passado) na Alemanha. Depois que a coisa esquentou é que muita gente se deu conta. No Brasil hoje, seguimentos religiosos estão cada vez mais partidarizados. Existe no Congresso Nacional a bancada Evangélica. Não tenho nada contra os Evangélicos, tenho contra essa bancada", esclareceu.

"Todo o fundamentalista religioso acha que quer o bem de todos, mas nenhuma igreja tem a capacidade de convencer a sociedade inteira. Precisamos abrir o olho porque está sendo chocado no Brasil o poder fundamentalista de confessionalização da política. Isso vai dar no fascismo. Nós queremos o Bem Viver, para isso precisamos de poder, para querer o poder nós precisamos aprender com a Palavra de Deus. A maior experiência de poder na tradição bíblica é a experiência de Jesus (ver Lc 22). Quem governa seja como aquele que serve. Esse é o maior testemunho de Jesus. O maior ato de Jesus foi quando ele se ajoelha para lavar os pés dos seus discípulos. Isso é o poder, colocar-se a serviço. Entre os Povos Indígenas o poder é partilhado", lembrou.

Além de conferências centrais com a participação de Frei Betto, Paul Singer, Pedro Oliveira e Graciela Chamorro, a programação deste sábado contemplou 26 Fóruns temáticos durante os quais, com a ajuda de assessores, os participantes puderam aprofundar os debates e propor encaminhamentos. O dia terminou com o lançamento da Agenda Latino-Americana e atividades culturais.

Na manhã do domingo, 17, a atividade mais aguardada é a conferência final sobre o tema do Encontro: "Cultura do Bem Viver: Partilha e poder". Esta será proferida pelo biblista e escritor, frei Carlos Mesters. Em seguida, acontece uma celebração de envio encerrando os trabalhos ao meio dia.

Criado em 1989 no Rio de Janeiro, o Movimento Nacional Fé e Política, em 2014, completará 25 anos. O 9º Encontro reúne cerca de duas mil lideranças de diversos movimentos populares, entidades, sindicatos e partidos de todo o Brasil.

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Fonte: Revista Missões

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