Maria Regina Canhos Vicentin *
Às vezes, eu me queixo com Deus. Nem sempre as coisas são como gostaria que fossem e, de alguma forma, acho que Ele tem algo a ver com isso. Nos momentos de dor ou tristeza queria que Ele tivesse pena de mim, mas parece que não tem. Por alguma razão, que não sei qual é, demonstra esperar mais do que posso oferecer. Eu queria entender, mas não consigo. Nem Madre Tereza entendeu, pois ela pedia para Deus não confiar tanto nela.
Sinto que em muitos momentos minhas forças parecem se esvair. Toda vez que as férias terminam e devo retornar ao trabalho me sinto assim. Há anos, o Judiciário se mantém com pouquíssimos funcionários, e os que lá se encontram precisam dar conta de uma demanda absurda, que extrapola em muito sua capacidade. O resultado é que ficamos doentes, mas parece que ninguém se importa realmente com isso. Creio que, se houvesse interesse, muitos afastamentos poderiam ser evitados. Não haveria a necessidade de esperar o funcionário adoecer. Nesses momentos, em que mesmo Deus parece não se importar, sinto-me órfã.
Por que o Criador permite tanto sofrimento, não sei. Creio que está sempre apostando na humanização do homem. Espera que sejamos solidários e minimizemos, nós mesmos, a angústia do outro. Tem gente neste mundo que é muito importante, pois possui o poder nas mãos. O poder mal empregado, no entanto, dissipa as oportunidades de auxílio ao próximo, prestando-se apenas ao próprio engrandecimento. Tal, confessemos, é realmente pouco perto do que seria necessário e urgente. Esbanja-se poder em beneficio próprio, enquanto a maioria mendiga melhorias que nunca acontecem.
Eu poderia achar que Deus simplesmente fecha os olhos para essas coisas, mas no fundo não acredito nisso. Continuo esperando o momento em que Ele irá agir. Se isso não acontecer, pelo menos acreditei que aconteceria; e essa crença, por si só me conforta, pois me faz sentir menos órfã do que me sinto algumas vezes.
Desculpem o lamento. É muito triste ver que o sofrimento de muitos poderia ser abreviado por quem detém o poder, e não é. Coisas que seriam relativamente simples para uns, são barreiras intransponíveis para outros.
E, tenho consciência, nem sempre isso acontece propositalmente. Muitos poderosos sequer têm noção do padecimento de seus subalternos. Não possuem intimidade suficiente com eles que lhes faculte falarem abertamente sobre suas aflições. Isso sem contar os que sofrem calados, por medo das consequências do falar.
É; certamente Deus espera que alguns acordem de seu sonho dourado e olhem ao redor, percebendo no olhar do próximo toda a dor e a dificuldade para viver com alegria. Embora ela seja um direito de todos, nem todos podem sorrir. Que este artigo sirva de alerta aos poderosos. Façam o que puderem para minimizar o sofrimento do seu próximo. Vocês não perderão nada, e ainda ganharão a oportunidade de fazer alguém feliz. Pode ser que tal atitude lhes sirva de passaporte para experimentar a graça de Deus.
* Maria Regina Canhos Vicentin (e.mail: contato@mariaregina.com.br) é escritora.
Fonte: www.mariaregina.com.br