Jaime C. Patias
"É tempo de recuperar fios de memórias que leve de novo a juventude a ser sujeita de projetos" (Pe. Vilson Groh).
O 4º dia do 10º Encontro Nacional da Pastoral da Juventude - ENPJ, que acontece desde o dia 8 de janeiro na cidade de Maringá, PR, focou sua atenção, nesta quarta-feira (11), nos 50 anos do Concílio Vaticano II convocado pelo Papa João XXIII e realizado entre os anos 1962 e 1965.
Dom Sinésio Bohn, bispo emérito de Santa Cruz do Sul, RS, que viveu em Roma todo o tempo do Concílio, lembrou que na época a Igreja andava um tanto cansada, teólogos queriam mais vitalidade, todos pediam uma renovação. Na Comissão Episcopal de Pastoral da CNBB, dom Sinésio foi o bispo responsável pelos setores do Ecumenismo, do Diálogo Interreligioso e da Pastoral da Juventude durante os anos de 1983 a 1990. De 1992 a 1995 foi também o Presidente do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC).
O bispo destacou alguns frutos do Concílio para o setor da juventude como a criação dos movimentos jovens, a organização dos assessores, o Congresso Latinoamericano de Jovens e o Dia Nacional da Juventude. "Era um tempo de imensa criatividade e os jovens estavam ansiosos para falar. Foi um tempo necessário depois da morte da Ação Católica quando os jovens não tinham mais espaço nem voz na Igreja", lembrou. Dom Sinésio foi também assessor da Pastoral Operária que criou muitas lideranças políticas e sindicais como o ministro Gilberto Carvalho, o ex-presidente Lula e o senador Paulo Paim, entre outros. Para ele "é preciso dar atenção aos jovens e investir neles, senão a Igreja vai acabar inútil como o sal que não salga, cheia de gente velha sem esperança".
Maicon Malacarne, recém ordenado padre é assessor da PJ da diocese de Erechim, RS, e relatou sua experiência como alguém que nasceu 25 anos após a realização do Concílio. O padre fez sua partilha utilizando três imagens: uma janela aberta para o mundo, imagem da Igreja que se abre para a realidade e respira novos ares; um menino representando a esperança, a exemplo de Jesus que nasce; e um olhar novo. A seguir, padre Maicon convidou os jovens a ajudá-lo olhar a realidade e destacou três características do Concílio: 1) o "aggiornamento" - renovação; 2) Igreja Povo de Deus, como categoria central; e 3) a dimensão dos sinais dos tempos à luz da Palavra.
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Na terceira exposição, padre Vilson Groh, que atua na periferia da Grande Florianópolis, idealizador do Projeto Travessia dedicado a resgatar jovens do tráfico, fez uma explanação histórica e traçou um paralelo entre a realização do Concílio e os documentos das Conferências Latinoamericanas e caribenhas de Medellin (1968), Puebla (1979), Santo Domingo (1992) e Aparecida (2007).
Padre Vilson é filho de operário das fábricas de Busque, SC. "Vivi a geração de Puebla e dos movimentos da clandestinidade, (anos 60 e 70) e pós-clandistinidade dos anos 80. É justamente nesse contexto que o Concílio Vaticano II se tornou concreto no Documento de Medellin, na formação das CEBs que vivem luzes e sombras", explicou.
Recordou também o que significou a Ação Católica enquanto luta e compromisso de tornar o Reino de Deus uma perspectiva de vida. "Depois veio a dimensão de sombra, nos anos 60, com o golpe militar e que reacende nos anos 70 com o Documento de Puebla na opção preferencial pela juventude e pelos empobrecidos. São documentos que precisamos ter como livros de cabeceiras para entender os sinais dos tempos e como Deus se manifesta nas luzes e sombras em nosso continente e nossa Igreja", sublinhou padre Vilson.
Para o assessor é preciso entender a importância do conceito "Igreja Povo de Deus", para saber o que é "Igreja-Comunhão", destaque no Documento de Santo Domingo. Ao comentar sobre o Documento de Aparecida, padre Vilson lembrou que este reafirma a Juventude, o laicato, as CEBs, a opção pelos pobres e traz a beleza que é ser discípulo missionário. "Seguir Jesus implica em seguir as suas causas, as bandeiras de Jesus e também olhar para Nazaré e para a Galileia. Significa olhar para a juventude que está sendo assassinada neste país. De 2006 a 2013 nós vamos perder 37.560 jovens assassinados. Eu vivo há 30 anos nas áreas de periferias da grande Florianópolis. No ano de 2000 fiz 80 funerais de morte violenta. A partir dessa situação produzida por um sistema que mata a nossa juventude, começamos a desencadear um movimento de desarmamento.
Aqui gostaria de dizer o que significa olhar o Vaticano II como luzes e sombras. O que essa juventude invisível nas periferias das grandes capitais diz para a Igreja. Não é tempo de triunfalismo, de saudosismo. É tempo de recuperar fios de memórias que leve de novo a juventude a ser sujeita de projetos, de controle social, de relacionar fé com a questão pública, fé com as questões políticas e sociais. Não podemos viver num país com os olhos fechados achando que não vivemos uma guerra civil".
"Qual é o grito?" perguntou padre Vilson, e respondeu: "é o grito do jovem crucificado. Precisamos recuperar essa realidade da juventude para a formação de políticas públicas. Mergulhar nessa realidade é o meu encantamento, porque a causa dos empobrecidos é a causa de Deus, é a causa de Jesus, a causa dos empobrecidos que a gente tem de adentrar para pensar projetos alternativos. Não podemos ficar apenas lendo a Bíblia e se encontrando mas dar razões à nossa esperança gerando projetos reais para a juventude".
Com essa motivação, padre Vilson liderou, em Florianópolis, a criação de projetos de formação de jovens universitários e de desarmamento de quadrilhas. O assessor apresentou um vídeo sobre jovens que deixaram o narcotráfico e criaram o movimento "Um novo caminho". Em seguida, conclamou os jovens a se inserirem na realidade, a estudar muito e a serem articuladores de processos de transformação.
O Encontro acontece no Centro de Formação Bom Pastor, anexo ao Seminário Arquidiocesano e conta com a participação de mais de 600 jovens entre coordenadores, líderes e assessores dos 17 regionais. O encerramento será na tarde deste sábado (14) com uma Marcha Contra a Violência e o Extermínio de Jovens que percorrerá as ruas de Maringá.
Fonte: Revista Missões