Egon Heck *
Na véspera de seus 80 anos, Mesters impressiona e surpreende. Com muita ternura e sabedoria, dispondo conhecimento bíblico e seu compromisso com o projeto de Vida de Javé.
Com os Kaiowá Guarani
Ao vir a Dourados, não o poderia fazer sem estar, por pouco tempo que fosse, com os mais desprezados e condenados desta região, os Kaiowá Guarani. Em sua visita pode sentir um pouco do sofrimento desse povo. A casa de reza ( oga pisy) caindo, é, talvez, um símbolo do impacto com uma sociedade que vai destruindo e inviabilizando a outra. Ali ele pode sentir o que sente um povo ligado intimamente à natureza, à floresta, aos rios e todas as formas de vida, ao ser confinado. É como o cupim que vai roendo os esteios por dentro, deixando a casa tão fragilizada que não resiste aos ventos mais fortes. Mesters viu, sentiu, gravou no seu coração o sofrimento do povo Guarani, que hoje tem em suas aldeias mais assassinatos, suicídios, atropelamentos, homicídios, do que os demais povos indígenas do país juntos.
Mesters também pode observar e sentir "povos da resistência", que mesmo no cativeiro, não desanimam de seus sonhos, de seus projetos de vida e felicidade. Fazem memória, lutam, buscam reconstruir sua autonomia, especialmente alimentar. Ao visitar a experiência apoiada pela diocese de Dourados, Vida Kaiowá, pode perceber o longo e difícil caminho da reconstrução da economia Guarani Kaiowá, numa situação de confinamento. Mas Deus não abandona seu povo. A casa de reza pode estar caindo mas a profunda espiritualidade não os deixará se abater.
A causa indígena tem sido abraçada com muito carinho por Frei Carlos Mesters desde a década de setenta, tendo assessorado o Cimi em suas reflexões na busca no compromisso solidário e testemunho profético junto aos povos indígenas. Ele estará contribuindo com nossas reflexões sobre os 40 anos da entidade, na Assembleia Nacional no início do próximo mês.
Bíblia e Ecologia
A reflexão sobre a ecologia é urgente e oportuna, no coração do agronegócio. Em alguns municípios a destruição da mata nativa chega a 98%, como no município de Juti. Em média o que resta da rica floresta dos ecossistemas da Mata Atlântica e cerrado, não passa de 8%. Uma situação que vem se agravando com o sistema de produção da monocultura que joga toneladas e toneladas de veneno e produtos químicos na terra todos os anos. Os rios vão morrendo, a mata se acabando, e a terra destruída, arrasada. E onde ficam os índios nessa situação? Sem suas terras tradicionais, eles vivem hoje uma das piores situações dos povos nativos hoje, em termos mundiais. Mesters lembrou essa realidade "para a qual não poderemos fechar os olhos". E perguntou "O que nós estamos fazendo, diante dessa realidade?"
O seminário "Bíblia e Ecologia", organizado pelo CEBI (Centro de Estudos Bíblicos) de Dourados, teme uma expressiva participação de pastorais, movimentos da igreja e sociais, interessados em aprofundar a visão bíblica sobre a natureza, ecologia, e buscar compromissos com a mudança urgente e radical do nossos conceitos, ações e sociedade. Nesse aspecto os quase 200 participantes tiverem uma oportunidade rara de abrir sua mente e coração, se despojar de todas as formas de fundamentalismos e se alimentar na fonte e fortalecer a dimensão libertadora do nosso compromisso cristão com a Vida.
Para início das reflexões nada melhor do que ouvir Leonardo Boff falando sobre as 4 ecologias. Ele deixa clama com a terra que não aguenta mais tamanha destruição. "Essa sociedade não é boa...precisamos criar novas relações com a mãe terra, senão teremos grandes devastações. O grito angustiante é de mudanças urgentes e radicais, ou pereceremos todos, com a terra.
Em vários momentos, olhando para a nossa sociedade e olhando para a desgraceira que estamos fazendo com a mãe terra, ele disse "temos muito que aprender dos índios...A natureza é a palavra de Deus..."
O jeito simples e vivencial de transmitir sabedoria, faz de Mesters, um mestre e testemunho por onde passa...O Deus da Vida e os povos agradecem!
* Egon Heck, Campanha Povo Guarani Grande Povo. Cimi, equipe Dourados, MS.
Fonte: Cimi MS