Laranjeira Nhanderu: mais um despejo decretado

Egon Heck *

"E como se meu coração saltasse fora do peito. Assim é minha dor quando falam que vamos de novo ser despejados". Essa expressão de Faride, lideranças Kaiowá Guarani, demonstra a situação de aflição, angústia e revolta com que a comunidade recebe mais uma sentença do despejo. Eufemisticamente fazem crer que a "transferência forçada", para um inóspito cantinho de terra do DNIT, às margens da rodovia 163. É mais uma ação ignominiosa, somada às atitudes genocidas que vem sendo perpetradas com esse povo.

Dourando a pílula
A cínica forma de oficiar mais esse despejo, remetendo a responsabilidade da mesma à Funai, é dourar a pílula, lavando as mãos diante de mais uma cruel violência e afronta aos direitos constitucionais e legislação internacional da qual o Brasil é signatário, que garantem aos povos indígenas o reconhecimento de suas terras.. A lei 6.001 de 1973 já determinava que o governo brasileiro seria obrigado a demarcar as terras indígenas dentro de cinco anos. Mais de 30 anos de sofrimento se passaram. E para reforçar essa obrigação do Estado, a Constituição de 1988 novamente dá um prazo de cinco anos para que o governo demarque todas as terras indígenas. Vão-se mais de 20 anos e os Kaiowá Guarani não tiveram a maioria de suas terras sequer identificadas.

Cabe mais uma vez a pergunta: a quem interessa essa afronta aos direitos, responsável por intermináveis conflitos, insuportável sofrimento, e inúmeros assassinatos de lideranças desse povo?

Aflição e dor
Juízes decidiram a expulsão, a Funai já recebeu a intimação, e o prazo para execução da mesma expira hoje, dia 21 de setembro. Quando a primavera se anuncia, com ela também chegam os decretos de aflição. Na mente e no coração dos 150 indígenas que estão num pequeno pedaço de área de proteção ambiental, à beira do rio Brilhante, passam as cenas de um ano e meio que viveram à beira da estrada. Nesse período tiveram três de seus membros mortos por atropelamento, perdendo inúmeros animais de criação esmagados pelos pesados veículos da rodovia, seus barracos alagados. Enfim, uma ladainha de sofrimentos que querem repetir.

A realidade vivida por essa comunidade a beira da estrada foi conhecida, pela CDDP Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humano, Pelo Secretário Geral da CNBB, Survival, Anistia Internacional, dentre outro.
Enquanto a presidente Dilma faz a abertura solene de mais uma sessão das Nações Unidas - ONU, provavelmente não estará sentido a angustia e sofrimento da comunidade Kaiowá Guarani de Laranjeira Nhanderu e da maioria desse povo que não tem suas terras reconhecidas e demarcadas.

Enquanto o CNJ - Conselho Nacional de Justiça se empenha em contribuir com a solução definitiva das terras indígenas no Mato Grosso do Sul, os despejos vão na contramão dessa iniciativa.

O que eles querem é apenas permanecer no local em que se encontram até que os relatórios de identificação sejam concluídos e eles possam viver em paz. Que a Funai cumpra sua obrigação de publicar o quanto antes os relatórios de identificação e desta forma tenha uma solução definitiva dessa situação.

Uma faixa de solidariedade aos Kaiowá Guarani, em setembro de 2009 dizia "Terra é Vida, Despejo é Morte". Essa comunidade precisa do apoio e solidariedade de todas as pessoas de boa vontade no Brasil e no mundo.

* Egon Heck, Povo Guarani Grande Povo. Assessor do Conselho Indigenista Missionário - CIMI.

 

Fonte: Cimi MS

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