Jaime C. Patias *
XII Capítulo Geral: "Evangelizar é sussurrar mais ao coração da pessoa".
Fundada em 1910, pelo Bem-aventurado José Allamano, a Congregação das Irmãs Missionárias da Consolata acaba de celebrar o seu primeiro centenário de história. As irmãs somam hoje 730 e estão presentes em 19 países da Europa, África, América e Ásia. Há 12 anos têm como Superiora Geral a irmã Gabriella Bono. Italiana de Boves, província de Cuneo, com 34 anos de vida religiosa, irmã Gabriella já trabalhou na Argentina, na formação de lideranças, com a juventude e com os Povos Indígenas.
Em São Paulo, para participar da Assembleia Continental que reuniu entre os dias 3 e 6 de janeiro representantes dos missionários e missionárias de todo o continente, em preparação para o próximo Capítulo Geral, irmã Gabriella foi entrevistada pela revista Missões e abordou temas relacionados à missão da Congregação e seus desafios. "Acredito que o continente americano tem muito para dar ao carisma e à missão numa caminhada de comunhão e colaboração", afirmou.
Madre Gabriella, quais seriam os principais elementos na vida de uma religiosa e missionária?
Na minha experiência, acompanhando as irmãs de Congregação nos últimos 12 anos, em diversos países, eu diria que o primeiro elemento é a convicção de que a nossa vida é uma escolha de amor por Jesus, em resposta ao seu chamado. Assim, toda a vida deve ser sentida como um amor apaixonado por Ele que é o Filho missionário do Pai e que nos chama a partilhar da mesma missão. Assim nos falava o nosso Fundador: "a melhor vocação e missão que Deus nos possa dar é aquela do seu Filho Jesus". É uma missão que orienta toda a nossa energia como mulheres consagradas, por toda a vida. Eu agradeço a Deus por ter experimentado e conhecido tantas missionárias e missionários que deram e estão dando a vida pela Missão, com simplicidade e meios pobres, no silêncio, mas com muito amor, colocando-se ao lado das pessoas, caminhando com elas, partilhando a vida, o sofrimento, a violência e as dificuldades para dizer: Deus está aqui. Quando visitei as irmãs na Somália, um muçulmano me disse: "até que nós temos as irmãs aqui sabemos que Deus não nos esqueceu, Ele lembrou-se de nós" (em setembro de 2006, a irmã e enfermeira italiana Leonella Sgorbati, MC, foi assassinada na Somália e as missionárias tiveram que deixar o país. Agora pretendem regressar).
As missionárias da Consolata trabalham em 19 países, na maioria deles juntamente com os padres e irmãos. Quais são as presenças mais significativas?
Graças a Deus temos ricas expe-riências, mas destacaria as que são as nossas típicas, voltadas para a defesa da vida, onde ela se encontra mais ameaçada. Por exemplo, nas Ilhas da Guiné Bissau, África, onde o povo não tem muitos meios para sobreviver e as mães morrem durante o parto (ver Testemunho nesta edição, pag. 14). São situações difíceis em que as irmãs permanecem com o povo. Outra presença significativa é a Missão Catrimani na Amazônia brasileira, onde as missionárias e missionários da Consolata, com os leigos, caminham com o povo Yanomami, partilhando a sua vida, enriquecendo-se dos seus valores, aprendendo a língua, a religiosidade, acompanhando as mulheres no cuidado da vida. O desafio é ser ponte para que os valores da religiosidade, da cultura desses povos originários se transformem em riqueza para toda a humanidade. Destaco ainda a vida dos missionários e missionárias na Mongólia, Ásia, onde enfrentam até 50° C negativos, esforçando-se para aprender a língua e entender a cultura, apresentando-se como homens e mulheres de Deus, testemunhos de consolação.
Os missionários e missionárias da Consolata partilham o carisma com os leigos e leigas. Como avalia a participação desse terceiro elemento na família?
As missionárias da Consolata há quase 20 anos partilham o carisma com os leigos. Vemos esse chamado de Deus como uma graça onde eles, desde a sua vocação laical, diferente da vocação religiosa ou sacerdotal, sentem-se atraídos pelo carisma do Bem-aventurado José Allamano. Com seu jeito, eles vão encarnando e enriquecendo o carisma, por isso os consideramos o terceiro elemento da nossa família. É uma graça porque eles vão nos enriquecer com o jeito de viver o carisma nos seus ambientes, no trabalho, na missão Ad Gentes. Esse era o sonho no nosso Fundador: ter uma família de irmãos e irmãs, seja como sacerdotes, leigos, irmãs e irmãos consagrados que juntos pensam, rezam e vivem um projeto missionário, numa dimensão de igualdade, unidos para servir a missão por toda a vida. Isso garante o futuro da família. Certa vez num encontro com os leigos no Quênia, um grupo da Tanzânia nos falava: "irmãs, agora vocês são menos numerosas, mas não se entristeçam, o carisma segue em nós missionários leigos".
As irmãs estão passando por um momento de escassez nas vocações. Como enfrentar essa crise?
A vida religiosa e apostólica, em geral, está enfrentando isso. Hoje, nós temos algumas jovens da África, que no momento oferece suas vocações. Estamos reformulando o projeto formativo para que o tempo antes do Noviciado seja mais comprido e a jovem chegue nessa etapa mais preparada. Os estudos que se faziam depois da Profissão, passaram a ser feitos antes. Mas essa situação de aridez nos questiona: como estamos vivendo o carisma? Estamos onde deveríamos estar e do jeito que deveríamos estar? Quais são as nossas prioridades? Estamos dando um testemunho de vida fraterna que convide outras jovens? Ao mesmo tempo, é uma oportunidade para repensar e despertar novo ardor missionário, sacudindo o pó dos pés, depois de cem anos de história.
Diante dos desafios atuais, qual seria o rosto da Missão do futuro?
A Missão do futuro seria, no meu modo de ver, pobre, pequena como uma sementinha e vivida no meio do povo. Seria feita em pequenas comunidades internacionais dando testemunho de fraternidade e não-violência. Uma Missão que leve a sério a defesa da vida e da criação, sem grandes estruturas nem mega projetos, mas ao lado dos povos. Gosto muito de uma frase vinda dos missionários na Ásia: "Evangelizar é sussurrar mais ao coração da pessoa". Isso significa muita aproximação, pois não se sussurra à distância. É ficar perto e falar ao coração, o que significa entrar na cultura, respeitar e amar a cultura para poder entrar na vida do povo, conduzidos pelo Espírito. Nós apenas damos nossa pequena contribuição sendo testemunhas de que Deus está no meio do povo. Isso nos enriquece porque o contato com o povo muda o nosso jeito de ser, até mesmo a nossa ideia e jeito de nos relacionar com Deus.
* Jaime Carlos Patias, imc, é diretor da revista Missões. Publicado na revista Missões, n.02 - Março 2011.
Fonte: Revista Missões