Reforma política: princípios e estratégias

Demétrio Valentini *

Pelo visto, começa a esquentar o debate, em vista de uma reforma política, que resolva os principais gargalos da prática de nossa democracia, e ao mesmo tempo seja viável, dentro do atual contexto político em que nos encontramos.

Dada a complexidade dos assuntos, é bom ir identificando algumas questões centrais, para perceber sua consistência, e ver como se inserem nos objetivos a se conseguir com as mudanças a serem feitas.

Para organizar os assuntos, é bom perceber a natureza das propostas, a fim de garantir a coerência das resoluções a serem aprovadas. Neste sentido, precisamos discernir os princípios, que devem reger a reforma, e as estratégias que favoreçam a execução dos princípios colocados.

Como primeiro princípio, toda legislação política está em função do bom relacionamento entre Estado e sociedade. É a sociedade que organiza o Estado, e precisa sempre estar atenta para o exercício do poder que ela delegou ao Estado, para manter o Estado dentro de suas finalidades e, quando necessário, reconvocá-lo a voltar a exercer o poder de acordo com as atribuições que lhe foram dadas, e dentro dos objetivos para os quais o Estado foi organizado.

Uma reforma política, como a que vai se desenhando, por enquanto, como grande aspiração da sociedade brasileira, tem a finalidade de reaproximar o poder político do seu nascedouro, a cidadania. A Constituição afirma muito claramente que "todo poder emana do povo, e em seu nome é exercido".

A sociedade, que delega o poder ao Estado, não pode simplesmente achar que o Estado vai sempre exercer este poder dentro das finalidades que lhe foram atribuídas. Ela precisa sempre sustentar as estruturas, e as motivações, para que o poder seja exercido de acordo com as finalidades que devem regê-lo.

Uma reforma política, no contexto atual, se apresenta claramente com a finalidade de atingir o âmago da estrutura do poder, e a forma de exercê-lo, tendo como critério básico inspirador a participação popular. Trata-se de reaproximar o poder e colocá-lo ao alcance da influência viável e eficaz da cidadania.

Em outras palavras, trata-se de tomar providências e medidas práticas para redemocratizar as relações entre Estado e sociedade, possibilitando a consecução das finalidades inscritas na Constituição Brasileira, atendendo ao anseio de aperfeiçoamento e consolidação da democracia, favorecendo o desenvolvimento eqüitativo de toda a população brasileira.

Passando dos princípios para as estratégias, se é a sociedade que precisa retomar as rédeas do Estado, é fundamental que ela esteja envolvida e participe do debate e formulação das propostas a serem aprovadas.

Neste sentido, quando se trata de reforma política, isto é, uma reforma que redefine pontos concretos do relacionamento entre Estado e sociedade, os membros do Parlamento, ao debaterem e votarem a reforma política, precisam se sentir em primeiro lugar não como detentores de um poder delegado, mas como membros, também eles, da própria sociedade, que é o nascedouro onde todos encontram a justificativa verdadeira de suas funções.

Quanto mais claros os princípios e generosos os objetivos, maior o desafio para definir as estratégias e os pontos concretos a serem contemplados. Pois esta reforma, pelas expectativas que já suscitou, não pode ser superficial e inócua. Ela precisa atender a pontos bem concretos, que devem ser levantados para que se criem as convergências indispensáveis para os consensos a serem conseguidos. Todos somos chamados a participar deste debate. O assunto vai continuar.

* Dom Demétrio Valentino é bispo da diocese de Jales-SP.

Fonte: www.correiocidadania.com.br

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