Marcelo Barros *
Se existe uma palavra mágica é o desejo. Quando desejamos com toda força interior, emitimos uma energia misteriosa que nos compromete no empenho de realizar o que desejamos. Isso pode ter conseqüências concretas para as outras pessoas e no mundo. Nestes dias, há quem tenha desejado "Feliz ano novo!" como mera formalidade social. Entretanto, a maioria das pessoas, de fato, anseia que este ano de 2011 seja um tempo mais feliz e de paz para si mesmo/a, para os entes queridos e para todo mundo. Por isso, quem, de coração, almeja os melhores votos de ano novo, precisa saber como transformar o seu desejo em caminho positivo para um futuro melhor.
As culturas e religiões antigas crêem na força da palavra. Em muitas religiões indígenas, as palavras curam ou, ao contrário, podem matar. Na Bíblia, vários salmos pedem a Deus que nos proteja dos "i pô ´allê ´awen", isto é, as pessoas que, com sua palavra, provocam males como doenças, tragédias ecológicas e todo tipo de infelicidade. Esta cultura dos amaldiçoadores vinha de Sumer onde existiam rituais de Shurpu, maldições do tipo que em nossa cultura popular se chamaria "rogar praga". No Novo Testamento, a 1ª carta de Pedro insiste que "nós temos a vocação da bênção, isto é, somos chamados a bendizer, ou seja, invocar o bem sobre as pessoas e sobre o universo (1 Pd 3, 9).
Para as culturas antigas, a palavra é eficaz quando nasce no mais profundo do coração e é precedida pela prática de vida. O Mahatma Gandhi ensinava: "Comece por você mesmo a mudança que deseja para o mundo". O Evangelho diz que a palavra de Deus se realizou em João Batista no deserto (Lc 3). Isso significa que, primeiramente João viveu a palavra e só depois a proclamou. Quando vivemos o amor, a generosidade, a solidariedade e a partilha de vida, então, o nosso desejo de que o mundo caminhe para isso se torna eficaz. Evidentemente que não temos força para mudar organizações sociais e sistemas complexos e baseados em leis estruturais. Não podemos pensar que somente pelo fato de desejar, conseguiremos transformar o mundo. No entanto, podemos contribuir para que se criem as condições necessárias para transformar estas leis e sistemas.
Você quer, de fato, que este ano seja um tempo de profunda renovação da sua vida? Deseja que isso repercuta bem para as pessoas ao seu redor e para todo o universo? Então, refaça neste início de ano novo o compromisso de, a cada dia, consagrar um tempo, por mínimo que seja, de gratuidade e interioridade para renovar um verdadeiro e profundo diálogo consigo mesmo/a. Ao mesmo tempo, comprometa-se em ser, cada vez mais, uma pessoa de diálogo com os outros, inclusive com as pessoas que pensam e agem a partir de valores que você não aprova. O diálogo mais fecundo é justamente com os que pensam e atuam diferentemente de nós. Além disso, procure de todos os modos intensificar a comunhão solidária com a terra, a água e todos os seres vivos do planeta. Faça isso e a bênção deste ano novo se realizará em você e, a partir de você, no mundo. Você constatará, então, como se tornarão verdadeiras e fecundas em sua vida, assim como para os que convivem com você, as palavras da antiga bênção irlandesa: "O vento sopre leve em teus ombros. Que o sol brilhe cálido sobre tua face, as chuvas caiam serenas onde moras. E até que, de novo, eu te veja, que Deus te guarde na palma da sua mão".
* Marcelo Barros é monge beneditino, autor de 37 livros, entre os quais O Amor fecunda o Universo (Ecologia e Espiritualidade) com co-autoria de Frei Betto. Ed Agir, 2009.
Fonte: www.adital.com.br