Nelson Mandela *
Mensagem de Nelson Mandela durante o Dia Mundial do Meio Ambiente de 1998.
Durante séculos, a Montanha da Mesa (Table Mountain) tem sido um símbolo da nossa cidade-mãe, a Cidade do Cabo. Durante os meus muitos anos de prisão em Robben Island, muitas vezes, contemplamos na Baía da Mesa (Table Bay) a magnífica silhueta da Table Mountain. Foi à sombra desta montanha que as primeiras guerras de resistência à dominação colonial foram travadas pelas tribos Khoikhoi (NT: também conhecidos como bosquímanos, hotentotes) que viviam na Península do Cabo. Pelas encostas da montanha os escravos da Indonésia e da Malásia, arrancados à força de suas casas no Leste, deixaram os restos mortais de seus líderes, de seus sábios e de seus homens santos. E foi em Robben Island que os príncipes de Sumatra e líderes religiosos foram exilados pelas autoridades holandesas, que em seguida governaram no Cabo e em Java. Os inúmeros santuários e templos (kramats) ao longo da Table Montain e em Robben Island tornaram esses lugares de peregrinação para muitos em nossa comunidade muçulmana, e contam sua própria história sobre a capacidade humana de perseverança, coragem moral e força.
Para nós em Robben Island, Table Mountain foi um farol de esperança. Ela representou a terra onde sabíamos que um dia voltaríamos.
Para o povo da África do Sul, os limites da Table Mountain representavam muito mais do que os restos rochosos de milênios de sedimentos. Possui um significado inestimável em relação à sua importância ecológica, cultural, religiosa e econômica, não apenas para a região do Cabo Ocidental, mas também para o resto do país.
Como povo e como país, a África do Sul está comprometida com uma escalada longa, árdua e desafiadora. Ao subir uma montanha, quando se encontra um desconhecido, não se pode deixar de notar a diferença na sua atitude. Unidos pelo mesmo propósito e experiência na ocasião dos encontros, o que um oferece ao outro é coragem e companhia. "Não falta muito para chegar", ele vai dizer nos mais diversos sotaques. Essa também tem sido a nossa experiência enquanto escalamos os picos desafiadores na construção de uma sociedade verdadeiramente democrática.
Hoje, é com imenso prazer que anuncio que o meu governo decretou essa renomada montanha e conhecida por todo mundo como parte do novo Parque Nacional da Península do Cabo. Estendendo-se de Signal Hill por todo o caminho para Cape Point e o Cabo da Boa Esperança, no extremo Sul da Península do Cabo, o novo Parque Nacional protegerá, para sempre, o coração do reino vegetal do Cabo. Menor dos seis reinos florais do mundo, a conservação do Reino Floral do Cabo é de responsabilidade única da África do Sul. Ao anunciar este novo Parque Nacional, o meu governo demonstrou que está comprometido em conservar esta parte rica do patrimônio biológico da Terra.
O WWF colaborou significativamente na consolidação dos Parques Nacionais Sul-Africanos através do estabelecimento do Table Montain Fund, um fundo verdadeiro que ajudará na conservação em longo prazo nesta área de relevância global. Por isso, estou feliz em anunciar que a criação deste novo Parque Nacional será um "presente sul-africano ao mundo", em relação à campanha do WWF pela preservação da biodiversidade florística. A África do Sul, como país signatário da Convenção sobre Diversidade Biológica, está empenhada em cumprir o seu papel na conservação do meio ambiente global. O que fizemos hoje, proclamando o Parque Nacional da Península do Cabo, é uma mensagem ao mundo no Dia Mundial do Meio Ambiente do real compromisso da África do Sul, para tornar esta Convenção internacional, uma realidade de trabalho em nosso país.
*Nelson Mandela é ex-presidente da África do Sul
Tradução: Ana Huara
Nota da tradutora: s Khoikhoi também são conhecidos como bosquímanos, ou hotentotes
Este texto é parte integrante da revista ECO 21, edição 163 de Junho de 2010, disponível nas bancas.
Fonte: www.envolverde.com.br