Antonius Tri *
Talvez o título que coloquei seja um enigma. Porém mais pra frente darei a resposta. É um título que praticamente saiu de uma situação triste que constatei que está acontecendo no mundo de evangelização atual através da música. A situação se torna mais triste ainda quando um(a) religioso(a), padre, freira que dedica a vida exclusivamente ao serviço do Reino usa este instrumento para evangelizar, mas depois esse serviço, cuja finalidade principal deveria ser o de evangelização, do anúncio à Boa Nova, torna-se um show business.
Para embasar meu pensamento vou relatar alguns acontecimentos que presenciei e que precederam minha conclusão sobre o assunto. Um dia conversando com uma pessoa que faz parte de um conselho regional de um movimento católico no Estado do Pará, soube que para poder trazer um cantor padre ou religioso para animar um evento deveria gastar em torno de setenta e cinco mil reais. O movimento queria realizar um congresso. E para alegrar o congresso, foi decidido convidar um cantor religioso. Mas tal valor é muito alto para nós que vivemos no Pará. O que aconteceu depois? O movimento encontrou forma alternativa e conseguiu que outra pessoa viesse com o custo apenas das passagens de ida e volta.
Outro exemplo: dois anos atrás um colega de uma paróquia, para alegrar a festividade do padroeiro, quis trazer um cantor-padre também. A paróquia teve que gastar mais ou menos cinqüenta mil reais. A comunidade por ser muito simples, teve muita luta e foi difícil cobrir essa despesa, mas ao final eles conseguiram.
Noutra situação, duas paróquias também quiseram realizar um show religioso para preencher a programação da festividade religiosa do seu padroeiro; convidaram cantores leigos, e para tanto uma gastou dez mil e a outra sete mil reais apenas.
Gente, Quanta diferença! O que nos entristece mais ainda é que os padres religiosos cantores colocaram o preço bem mais alto. E pior, aqueles que colocaram o preço bem alto, às vezes, também fizeram muitas exigências, acima do razoável. Por que tanta diferença assim? O show, independentemente de ser realizado por um ou por outro, tem a mesma finalidade: Evangelizar!
É verdade que no mundo profissional as pessoas precisam fazer um trabalho de qualidade exigindo, entre outros requisitos para o bom êxito, o uso de equipamentos modernos, alta tecnologia, profissionais em todo o desenrolar do evento, e isso custa caro. Porém, será que precisa de tanto dinheiro assim? Será que em nome do profissionalismo pode a religião ser usada dessa maneira? As pessoas pobres querem assistir ao show, mas não podem pagar o ingresso porque este custa caro. Onde ficaria a simplicidade, a pobreza, os preferidos de Jesus? Não eram eles os escolhidos para ouvir Jesus pregar e não eram eles, especialmente, a quem Jesus dirigia a palavra? Os continuadores da missão de Jesus, tem feito também essa opção de simplicidade? Ou os seus shows não tem esse caráter evangelizador? E se não tem, qual a sua finalidade?
Sou um padre estrangeiro. Cheguei em meados de janeiro de 2004 e na maior parte deste tempo, trabalhei na diocese de Abaetetuba - PA. Lembro-me de que, quando eu era recém chegado, as festas das paróquias eram quase uma festa qualquer, com cerveja e o show de uma banda de forró, brega, melody, etc. Graças a Deus, algumas paróquias começaram mudar o estilo das festividades. Não tem mais o show de uma banda "social", mas show religioso.
No final de 2007, a nossa diocese através da Assembleia do Povo de Deus, decidiu realizar a festividade do(a) padroeiro(a) sem bebida alcoólica. No início foi difícil, mas depois o povo foi se acostumando e hoje entende melhor. Penso que a mudança foi no sentido de ajudar a sociedade, devido ao mal ou indevido uso e exagero que se faz de bebidas alcoólicas. Embora a bebida faça parte das festas em geral, não podemos condenar o uso correto dela, pois, compreendo que as pessoas cristãs podem beber com moderação, sem excessos e se confraternizarem adequadamente.
Lembremos que o próprio Jesus transformou água em vinho numa festa em que ele esteve presente com sua mãe. Lá Jesus interveio quando a bebida faltou, fazendo o milagre e assim, alegrou os convivas.
Mas, para ajudar a compreender a preocupação da decisão em abandonar de vez o uso de bebidas alcoólicas em nossas festas, ilustremos com o seguinte exemplo: Quando estamos doentes, às vezes, o médico nos pede para deixarmos de comer determinados tipos de alimentos, pois poderia piorar ainda mais o nosso estado de saúde. Assim também a recomendação da abstinência do álcool à sociedade pela Igreja, pois esta se encontra doente, tão marcada pela violência, pelas bebedeiras, pelas orgias e a Igreja não podia ter outra atitude, senão esta; pois a sociedade mudou e não podemos conviver como se ela estivesse como a de 25 anos atrás.
A Igreja deu o exemplo, porque, frente às situações novas, devemos dar respostas novas. Da mesma forma que não podemos ir e vir tranquilamente em nossos bairros a qualquer hora, assim também foi tomada a atitude da igreja em mudar as nossas festas. A bebida alcoólica era uma atração para as festividades da Igreja antigamente, todavia, hoje, no lugar desta bebida, tentamos buscar novas maneiras para atrair as pessoas para a festividade religiosa. Uma delas é o show religioso, porque acreditamos que os nossos cantores religiosos cantam e ao mesmo tempo evangelizam.
Porém, com os altos preços atualmente cobrados pela maioria dos nossos cantores religiosos, o que podemos fazer? No trecho de Mateus diz assim: "Foi entregue a Jesus o livro de profeta Isaias; desenrolou-o, e encontrando o lugar onde está escrito leu: O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou pela unção para evangelizar os pobres, enviou-me para proclamar a libertação aos presos e aos cegos a recuperação da vista, para restituir a liberdade aos oprimidos e para proclamar um ano de graça do Senhor". (Mt 4,17-19).
Aqui para nós, que moramos no norte do país, será que um show religioso que o ingresso custa R$ 80,00 e a mesa R$ 400,00 é um show que evangeliza os pobres? É um show que proclama um ano de graça do Senhor?
* padre no estado do Pará.
Fonte: Revista Missões