Luz para a humanidade

Patrick Gomes Silva *

A epifania é uma festa decididamente missionária, pois é a manifestação de Jesus como "a luz" que atrai a si todos os povos da terra. Essa "luz" encarnou em nossa história, a fim de iluminar os caminhos da humanidade e oferecer-lhe uma proposta de libertação. Os "Magos", atentos aos sinais da chegada do Messias, vão ao encontro desta "luz", a aceitam como "salvação de Deus" e a adoram. A salvação, rejeitada pelos habitantes de Jerusalém, torna-se agora uma oferta universal. Nossa leitura orante deste mês segue a proposta da liturgia da Epifania e, assim, rezaremos com o texto de Mateus 2, 1 a 12.

O texto apresenta-nos a visita dos Magos ao menino de Belém. Trata-se de um episódio que, ao longo dos séculos, tem provocado um impacto considerável nos sonhos e nas fantasias dos cristãos... No entanto, não estamos diante de uma reportagem jornalística que faz a cobertura da visita oficial de três chefes de Estado a um outro país; estamos diante de uma catequese sobre Jesus, destinada a apresentar Jesus como o salvador de toda a humanidade.

Leitura
Os numerosos detalhes do relato demonstram, que a intenção do evangelista não é de tipo histórico, mas sim catequético. De assinalar, em primeiro lugar, a insistência de Mateus no fato de Jesus ter nascido em Belém (cf. Mt 2,1.5.6.7). Sabemos que esta insistência é porque Belém era a terra natal do rei David. Deste modo, afirmar que Jesus nasceu em Belém é associá-lo aos anúncios proféticos que falavam do Messias como o descendente de David que havia de nascer em Belém (cf. Miq 5,1.3; 2Sam 5,2). Com esta nota, Mateus quer aquietar aqueles que pensavam que Jesus tinha nascido em Nazaré e que viam nisso um obstáculo para O reconhecerem como Messias.

Em segundo lugar, notamos, a referência a uma estrela "especial" que apareceu no céu por esta altura e que conduziu os "Magos" para Belém. A interpretação desta referência como indicação histórica levou alguém a cálculos astronômicos complicados para concluir que, no ano 6 a.C., uma conjunção de planetas explicaria o fenômeno luminoso da estrela refulgente mencionada por Mateus; outros andaram à procura do cometa que, por esta época, devia ter sulcado os céus do Médio Oriente... Na realidade, não podemos entender esta referência como histórica, mas antes como catequese sobre Jesus. Segundo a crença popular, o nascimento de uma personagem importante era acompanhado da aparição de uma nova estrela. Também a tradição judaica anunciava o Messias como a estrela que surge de Jacob (cf. Nm 24,17). É com estes elementos que a imaginação de Mateus, posta ao serviço da catequese, vai mencionar a "estrela". Mateus está, sobretudo, interessado em fornecer aos cristãos da sua comunidade argumentos seguros para rebater aqueles que negavam que Jesus era o Messias esperado.

Temos, ainda, as figuras dos "Magos". A palavra grega "mágos", usada pelo evangelista, abarca um vasto leque de significados e é aplicada a personagens muito diversas: mágicos, feiticeiros, sacerdotes persas, propagandistas religiosos... Aqui, poderia designar astrólogos, entrados em contato com o messianismo judaico. Seja como for, esses "Magos" representam, na catequese de Mateus, os povos estrangeiros que o profeta Isaias falara (cf. Is 60,1-6), que se põem a caminho de Jerusalém com as suas riquezas (ouro e incenso) para encontrar a luz salvadora de Deus que brilha sobre a cidade. Jesus é essa luz. Luz para a humanidade inteira.

Além de uma catequese sobre Jesus, este relato recolhe, de forma paradigmática, duas atitudes que se vão repetir ao longo de todo o Evangelho: o povo de Israel rejeita Jesus, enquanto que os "Magos" do oriente (que são pagãos) O adoram; Herodes e Jerusalém "ficam perturbados" diante da notícia do nascimento de Jesus e planeiam a sua morte, enquanto que os pagãos sentem uma grande alegria e reconhecem-no como o seu Senhor.
Mateus anuncia, desde logo, que Jesus vai ser rejeitado pelo seu povo; mas vai ser acolhido pelos pagãos, que entrarão a formar parte do novo Povo de Deus. O itinerário seguido pelos "Magos" reflete o processo que os pagãos seguiram para encontrar Jesus: estão atentos aos sinais (estrela), percebem que Jesus traz a salvação, põem-se decididamente a caminho para O encontrar, perguntam aos judeus - que conhecem as Escrituras - o que fazer, encontram Jesus e adoram-no, regressando a suas casas por um outro caminho.

Meditação
Em primeiro lugar, meditemos nas atitudes das várias personagens que Mateus nos apresenta em confronto com Jesus: os "Magos", Herodes, os príncipes dos sacerdotes e os escribas do povo... Diante de Jesus, eles assumem atitudes diversas que vão desde a adoração (os "Magos") até à rejeição total (Herodes), passando pela indiferença (os sacerdotes e os escribas: nenhum deles se preocupou em ir ao encontro desse Messias que eles conheciam bem das Escrituras). Com quem destes grupos nos identificamos?
Não será que é fácil "conhecer as Escrituras" e, depois, deixar que as propostas e os valores de Jesus nos passem ao lado?

Os "Magos" são apresentados como os "homens dos sinais", que sabem ver na "estrela" o sinal da chegada da libertação. Somos pessoas atentas aos "sinais" - isto é, somos capazes de ler os acontecimentos da nossa vida e da história do mundo à luz de Deus? Procuramos perceber nos "sinais" a vontade de Deus?

Impressiona também, no relato de Mateus, a "desinstalação" dos "Magos": viram a "estrela", deixaram tudo, arriscaram tudo e vieram procurar Jesus. Somos capazes da mesma atitude de desinstalação, ou estamos demasiado agarrados às nossas "coisas", ao nosso colchão, à nossa televisão, à nossa Internet? Somos capazes de deixar tudo para responder aos apelos que Jesus faz através dos outros?

Conclusão
Os "Magos" representam as mulheres e os homens de todo o mundo que vão ao encontro de Cristo e que se prostram diante dele. É a imagem da Igreja, essa família de irmãs e irmãos, constituída por gente de muitas cores e raças, que aderem a Jesus e que o reconhecem como "o Senhor". Celebre a alegria de pertencer a esta família universal.

* Patrick Silva, imc, diretor do Centro Missionário José Allamano - SP. www.imconsolata.org.br

 

Deixe uma resposta

cinco × cinco =