Odilon de Oliveira*
O Brasil sempre desempenhou um papel ridículo no combate ao tráfico de drogas. Os países sérios nesta questão, dentre eles não se incluindo o Brasil, atacam o problema das drogas sob quatro frentes: prevenção, repressão, recuperação e reinserção.
A prevenção, se levada a sério, é o caminho mais eficaz, mais curto e menos gravoso, dependendo ela de ações sociais e do envolvimento de toda a sociedade. A repressão existe simplesmente porque a prevenção é falha, mal feita. Nessa segunda frente, há o envolvimento do Poder Judiciário, do Ministério Público, das polícias e do sistema penitenciário, que é caótico. É uma estrutura monstruosa e caríssima envolvida na repressão. Quando chega a necessidade de repressão, o tráfico já causou estragos na saúde, na segurança pública, na economia e na imagem da Administração. Esta fase é agravada também pela corrupção, que atinge todos os setores nela envolvidos, principalmente o meio policial e o ambiente carcerário.
Fracassada a repressão, surge uma legião de dependentes e usuários e, com ela, a necessidade de tratamento dos viciados. É a chamada fase da re-cuperação, caríssima também e mal praticada.
O Brasil não possui uma política responsável nesta área. Os leitos destinados a tal são pouquíssimos e o trata-mento é feito pelo Sistema Único de Saúde (SUS), com limitação de prazo de internação. Na maior parte dos casos de dependência, o tratamento envolve equipe multidisciplinar: psiquiatra, psicólogo e atividades adequadas à recuperação.
Tratamento e internação particulares ninguém suporta pagar. Basta ver quanto custam uma diária de hospital, consultas e terapias com especialistas. O resultado é o fundo do poço. Em decorrência, surgem o sofrimento da família e do próprio dependente e todas as conseqüências decorrentes. O maior desejo do dependente (e não do mero usuário) é se ver livre do vício.
Somente em torno de trinta por cento dos que procuram tratamento se recuperam. Sobram os setenta por cento que não se curam e mais aqueles que não buscam tratamento.
Aí, surge uma nova necessidade: reinserir na sociedade, na família e no trabalho os que deixaram o vício. Os demais já ficaram pelo meio do caminho. É a chamada fase da reinserção. Aqui, é maior ainda a falta de seriedade do Brasil. A Lei n.º 11.343/2006 contêm normas razoáveis sobre a reinserção (como também sobre a prevenção), mas, na prática, a realidade é outra, bem distante do que está escrito.
O Brasil não procura encarar de frente o problema, que atinge as parcelas mais vulneráveis da população, caracterizadas pela carência material e só-ciocultural. Penso que o principal componente da reinserção é o trabalho. Sem ele, não há auto-estima.
Nesta fase, é indispensável a participação de todos os segmentos da sociedade, principalmente da classe empresarial, geradora de empregos. O ideal seria que, por lei, e mediante compensação fiscal, as empresas fossem obrigadas a reservar vagas para pessoas comprovadamente recuperadas e necessitadas, em quantidade proporcional ao número de empregados.
Por fim, lamento que o ex-presidente FHC, falando na Comissão Latino-Americana, e os Ministros designados por Lula para estudarem medidas com vista à descriminalização do consumo de maconha desconheçam que a legislação brasileira já proíbe, em relação a qualquer tipo de droga, a prisão de usuários e dependentes desde agosto de 2006. A questão das drogas não deve ser tratada por intelectuais, mas por quem efetivamente conheça o fenômeno.
* Juiz Federal titular da única vara especializada no processamento dos crimes financeiros e de lavagem de dinheiro de Mato Grosso do Sul. Já condenou centenas de traficantes internacionais e sonha ver a juventude livre das drogas.
Fonte: odilon.telmeworlds.sg